Blog Rio Preto Noutros Tempos - por Rodrigo Magalhães*
A famosa
rubiácea foi a principal responsável pela colocação da região em posição
destacada na história imperial brasileira, época em que o seu território serviu
de palco para extraordinária produção cafeeira, considerada uma das maiores do
país e do mundo. Por isso recebeu o nome de Vale do Café!
Devido
à proximidade ao território fluminense do município de Resende, onde o arbusto
penetrou ainda nos anos 1700 e que também é banhado pelo rio Preto, o solo de
Rio Preto entrou para a história nacional como aquele que abrigou a pioneira
muda do hoje tradicional e famoso café em Minas Gerais.
“(...) No Rincão do Rio Preto é que se plantou o
primeiro pé de café, na então Província de Minas Geraes” – registrou o
pesquisador José Marinho de Araújo, membro do Instituto Histórico e Geográfico
de Minas Gerais. Essa informação de incontestável valor histórico também é
citada por diversos outros autores como Daniel de Carvalho, Basílio de
Magalhães e, especialmente, Hildebrando de Magalhães, além de publicações
diversas de órgãos mineiros e nacionais.
Hildebrando de
Magalhães nasceu em Campinas/SP, em 1902. Era filho do historiador, jornalista
e político mineiro Basílio de Magalhães, que foi professor de História em São
Paulo e, depois, no Rio de Janeiro, além de Senador por Minas em 1922. Basílio
estudava com afinco a História do café em Minas Gerais, e provavelmente, foi o
primeiro a apontar o município de Rio Preto como a porta de entrada do café em
solo mineiro.
Seguindo os
passos do pai, Hildebrando logo envidou seus melhores esforços literários na questão do café. Publicou um extenso livro
chamado “História do café”, bem como outro com o nome “Contribuição para a
história do café”. Escreveu, ainda,
diversos artigos sobre o tema nos principais jornais de Minas Gerais, razão
pela qual foi o escolhido pelo doutor Assis Chateau-briand para organizar uma
seção para “O Jornal”. Nasceu assim o livro intitulado “O CAFÉ EM MINAS
GERAES”, publicado em 1933, no qual o renomado autor afirma que “(...)
si de Resende foi que se expandiu para S. Paulo e Minas, - nesta, pela posição
topográfica do citado município fluminense, deve ter penetrado pelo rincão de Rio-Preto...”
Segundo Hildebrando de Magalhães, “data, sem dúvida, de fins do século XVIII o ingresso do cafeeiro em
Minas”. Acrescenta, ainda, que “por 1851, ao que se consignou em fonte
oficial, as lavouras do café estavam normalmente estabelecidas, na zona da
Mata, nos municípios de Presídio do Rio-Preto, Santo Antônio do Parahybuna,
Barbacena e Mar-de- Espanha; e haviam apenas começado a desenvolver-se em
Leopoldina, Ubá e Muriahé”.
Daniel de
Carvalho (1887-1966), por sua vez, foi outra figura destacada que também
apontou o solo riopretano como o pioneiro cafeeiro em Minas Gerais. Ele foi
professor de História, deputado federal e até mesmo Ministro da Agricultura.
Escreveu diversos artigos em jornais e livros, e era membro do Instituto
Histórico e Geográfico de Minas Gerais.
O
início
O
registro mais antigo de uma considerável plantação de café na região foi feito pelo
francês Saint-Hilaire, e data de fevereiro de 1822. Segundo ele, dois franceses
possuíam uma venda na Aldeia das Cobras (próximo à Rio Bonito, no município de
Valença/RJ), onde há muito tempo residiam. Conta-nos que esses dois franceses “haviam
feito, pelas próprias mãos, considerável plantação de café, nas terras do
desembargador Loureiro (...) e temendo alguma trapaça, venderam as plantações
por duzentos mil réis, antes que produzissem. E asseguram que neste anno (1822)
o comprador ou o próprio Loureiro, que ficou em seu logar, lucrarão dois mil
cruzados”.
Acredita-se
que foi graças às observações de um pároco, na década de 1830, que os abastados
fazendeiros do Vale do Rio Preto decidiram investir suas respectivas fortunas
para custear o plantio do café em larga escala nos municípios dessa região,
como Valença e Rio das Flores, no estado do Rio de Janeiro, e Rio Preto, Santa
Bárbara do Monte Verde, Santa Rita de Jacutinga e Belmiro Braga, em Minas
Gerais.
Seu nome era
João Joaquim Ferreira de Aguiar. Em 1832, ele participou da fundação da
Sociedade Defensora da Liberdade e Independência Nacional da Vila de Valença,
que reunia os grandes proprietários rurais do município. Essa sociedade criou
um periódico – O Valenciano, veículo
de informação através do qual o Padre Aguiar passou a publicar seus estudos
defendendo a viabilidade técnica e econômica do plantio do café. Em 1836, ele
publicou um Manual de Plantação, Cultura e Colheita.
Padre
Aguiar era um profundo conhecedor de agronomia. Ele era sócio da Sociedade
Auxiliadora da Indústria Nacional (SIAN), uma instituição fundada na década de
1830 dedicada ao estudo de todos os aspectos inovadores que pudessem
impulsionar a agricultura no Brasil. Foi por influência desse padre que entre
as décadas de 1830 e 1840 vários fazendeiros do Vale do Rio Preto se associaram
à SIAN, como o Visconde de Baependy, que por várias ocasiões chegou a fazer
parte da sua diretoria, inclusive.
Sabe-se
que foi o Visconde de Baependy o outro cidadão responsável pela entrada em cena
do café na região. Ele funcionou como uma espécie de ligadura entre as demais
famílias de grandes proprietários rurais para que os investimentos no plantio
do café se tornassem atrativos e rentáveis. Pode-se dizer que a parceria entre
o Padre Aguiar e o Visconde de Baependy foi fator decisivo para colocar o café
como primeiro lugar na produção de larga escala na região, nas décadas que
sucederam a sua escolha como fruto padrão para o plantio no fértil e vasto
território do Vale do Rio Preto.
O Brasil é o café e o café é o Vale
Registrou-se,
então, uma extraordinária produtividade de café nos vales dos rios Preto e
Paraíba do Sul. “O Brasil é o café e o café é o
Vale", era uma frase corriqueira no país em meados do século XIX.
Estima-se que na
década de 1860 essa região produzia 75% do café consumido no mundo, e assim garantia
ao Brasil a condição de líder mundial na produção e exportação de café. Somente
Valença e Vassouras, por exemplo, chegaram a produzir 100 arrobas de café beneficiado
por 1.000 pés, números expressivos que os colocou entre os maiores municípios
cafeeiros mundiais do século XIX.
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| Candido Portinari |
O
Ciclo do Café foi um período da história do Brasil durante o qual a produção
cafeeira teve grande importância para o desenvolvimento econômico do país. Ele também
trouxe muita riqueza para os grandes proprietários rurais de Rio Preto. Grandes
e suntuosas casas sede de fazenda foram erigidas no município. Na então vila,
imponentes sobrados e palacetes passaram a fazer parte da paisagem,
especialmente na Rua Direita (atual rua Dr. Esperidião), o logradouro mais
importante da localidade. Era ali que os mais abastados fazendeiros possuíam as
suas respectivas “Casa da Cidade”.
Surgiram
também os títulos nobiliárquicos. Os chamados “Barões do Café”. No município de
Rio Preto, entre esses nobres, destacavam-se aqueles ligados às duas principais
fazendas da época: Santa Clara e São José. Viscondessa do Monte Verde e o Barão
de Santa Clara, de um lado, e Barão de São José e Barão de Souza Lima, por
outro, foram os sucessivos proprietários dessas duas grandes produtoras de café
de Rio Preto que, devido a grande importância socioeconômica para o município,
os logradouros que conduziam às suas sedes foram denominados, respectivamente,
Rua Santa Clara e Rua São José.
O Brasil é o café e o café é o
negro
Entre 1830 e 1850, a região se desenvolveu graças a esses barões do café. Mas é fato que eles fizeram fortuna às custas de trabalho escravo. Durante boa parte do ciclo do café, a mão de obra utilizada nas lavouras e no transporte foi a dos escravizados de origem africana.
Estima-se que 4,9 milhões de africanos foram escravizados e trazidos para o Brasil. Essas pessoas tiveram suas famílias desmembradas, seus nomes e identidade quase que completamente apagados.
Acredita-se que
eles representavam 2/3 da população local à época. Por isso, é preciso sempre
lembrar que o ciclo do café está diretamente ligado a um dos períodos mais
terríveis de nossa história: a escravidão.
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| Candido Portinari |
Símbolos do ciclo do café
Além
das grandiloquentes casas sede dessas fazendas do ciclo do café que ainda
resistem ao tempo, bem como algumas edificações existentes na cidade, o maior
símbolo dessa fase de apogeu financeiro durante o período imperial é, sem
dúvida, a majestosa Matriz de Nosso Senhor dos Passos de Rio Preto.
Ricamente finalizada
pelo artista catalão Villaronga, com
recursos próprios dos abastados proprietários da fazenda Santa Clara –
Viscondessa do Monte Verde e Barão de Santa Clara e mão de obra dos africanos
escravizados, os personagens mais símbólicos do ciclo do café, esse templo até
os dias atuais é o principal cartão postal da cidade de Rio Preto!
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| Matriz de Nosso Senhor dos Passos de Rio Preto/MG. |
Rodrigo Magalhães é
pesquisador e historiador riopretano!
EM TEMPO: Recentemente obtive
êxito em adquirir o livro intitulado O
café em Minas Geraes, que há muitos anos procurava, por ser a obra que serve
de subsídio para fundamentar o apontamento do solo riopretano como o pioneiro
em receber o cafeeiro em Minas. Assim, sugiro às autoridades municipais a
explorarem turisticamente uma constatação histórica de tamanha importância. Quem
sabe a colocação de uma placa nas entradas da cidade com os seguintes dizeres: Bem-vindo
à Rio Preto – o município onde foi plantado o primeiro pé de café em Minas
Gerais!
FONTES:
* O café em Minas Geraes, de Hildebrando de Magalhães;
*Segunda Viagem do Rio de Janeiro a Minas Gerais e São Paulo (1822), de August Saint-Hilaire;
*A Introdução do café
no Vale do Paraíba do Sul (Coleção Vale do Café), de Antônio Carlos da Silva, Gislene Braz e Iam
Senna;
*Descoberto da
Mantiqueira – O Sertão Prohibido do Rio Preto, de Rodrigo Magalhães;
*Rio Preto: Estado de
Minas – Propaganda do Brasil por municípios, de Symphronio de Magalhães;
*Rio Preto: Resumo Histórico,
de José Marinho de Araújo.









